Círio 2008 – 50 anos de Evangelização
Reflexões para a Procissão
Maria
de Fátima dos Santos Vale
Acolhida:
Maria nos convida a encarnar a Palavra de Deus no
seio de nossas famílias.
A tradição da Igreja nos apresenta
Maria como uma jovem de fé esclarecida. A Sagrada Escritura fazia parte do
dia-a-dia de sua família e por ela era meditada e vivenciada. Por esse motivo,
Maria, como todas as jovens de sua época aguardavam a realização das profecias
sobre a vinda do Messias.
O anúncio de que seria a mãe do salvador
deixou-a intimamente perturbada, mas importância da notícia não a encheu de
orgulho. Ela não apresentou a desculpa do casamento próximo e o medo de ser
abandonada. Nem mesmo a certeza do apedrejamento a fez recuar. Apenas confiou e
se colocou como serva a disposição da vontade de seu amo. Abriu o coração à
Palavra de Deus, se dispôs a acolher a vontade do Pai e a Palavra de Deus
fecundou e se encarnou no seu ventre.
Há 50 anos atrás as famílias de
Tracuateua não tinham intimidade com a Bíblia, mas inda se importavam em seguir
a Palavra de Deus proclamada pelo padre nas poucas vezes em que vinha à antiga
capela. Cada desobriga era como a visita do arcanjo Gabriel à Maria: as
famílias voltavam para casa animadas a “gestarem” a Palavra de Deus no seio da própria
família.
Hoje a maioria das famílias tem muito
mais acesso à Bíblia, mas não se disponibilizam a conhecer a vontade de Deus.
Há mais ministros da Palavra, porém há também mais desculpas a serem
apresentadas. E, assim, a Palavra de Deus quase não encontra famílias onde se
encarnar.
Que ao celebrarmos os 50 anos do Círio,
Maria possa receber de presente de cada um de nós o compromisso de estruturar nossas
famílias na Palavra de Deus e de alicerçar nossos lares numa vivencia de fé encarnada
na realidade de nosso povo.
1ª REFLEXÃO:
Tema: Maria é
o silêncio que clama por vida digna aos povos da Amazônia.
(Lc 2, 33-35 - Profecia de Simeão)
É inegável a admiração e a satisfação de uma mãe quando alguém
elogia seus filhos. Não foi diferente com Maria Santíssima. Jesus foi enviado
para assumir uma missão muito importante e; ainda pequeno, em seu colo, era
motivo de alegria e de bênçãos. Mas por causa de sua missão, uma espada
traspassaria a alma de sua mãe.
Assim tem sido com a Amazônia. O mundo se delicia com suas belezas,
seus sabores, seu clima, sua gente. Mas, muito se tem profetizado sobre o seu
destino. Segundo estudiosos, a vida na Amazônia está com os dias contados. A
espada que traspassou o coração de Maria traspassa também o coração da Amazônia
e do seu povo. E este povo, ameaçado e ferido em sua dignidade é humilde se
torna silencioso; o que o faz forte, organizado e atuante.
Muitos são enviados para uma missão na Amazônia e, a exemplo de
Jesus, tornam-se pedra de tropeço e alvo dos pensamentos assassinos dos
poderosos. Mesmo com o fantasma da
perseguição e da morte, multiplicam-se os grupos, estimulam-se os debates;
planejam-se saídas, alcançam-se vitórias.
Maria é como a alma da Amazônia. Semente que tem por missão gerar
vida nova. Grito que ecoa e clama pela boca dos sofridos e abandonados. Canto
suave que devolve a esperança à povos em via de extinção.
A Amazônia Atlântica, também começa a despertar. Há algum tempo
Associações e Sindicatos, ONG e Cooperativas, Conselhos e Pastorais vêm sendo
criados com o objetivo de garantir uma vida mais digna ao povo e ao meio
ambiente de Tracuateua. São iniciativas que nos impulsionam a acreditar na vida
como Plano da Criação Divina e no ser humano como colaborador desse Plano. Por
isso, a Igreja não pode furtar-se ao dever de apoiar, orientar, incentivar e
assumir iniciativas de luta em favor da vida. E nenhum batizado deveria
calar-se diante da realidade agonizante da Amazônia.
Que o silêncio de Maria ecoe na Amazônia como sinal de bênção e
de esperança para todos os povos e luz que ilumina e fortalece os projetos e os
movimentos de defesa da vida no ambiente amazônico.
2ª REFLEXÃO:
Tema: O
segredo da maturidade participativa dos povos da Amazônia consiste na
experiência de veneração dos idosos à Senhora de Nazaré.
(
Lc. 2, 36-38 – Profetiza Ana)
Quando Maria e José apresentam Jesus no Templo, todos que esperavam
pela redenção de Jerusalém ficaram impressionados com o que se dizia daquele
menino. Nesse episódio, uma personagem nos chama a atenção. A profetiza Ana.
Vemos no exemplo dessa viúva de oitenta e quatro anos, a imagem
de tantos outros idosos na Amazônia. Mulheres e homens de idade avançada,
índios, caboclos, negros, mulatos... Abandonados, pelos filhos e pelo governo
que os oprime; marginalizados e açoitados por uma sociedade em que o padrão de
vida gira em torno da beleza, da juventude e do dinheiro. Gente que amarga em
grandes filas e mesmo assim, ainda acredita na transformação da sociedade pela
justiça divina. Alguns chegam a impacientar-se com o presente, mas
silenciosamente rezam por um mundo mais digno para as gerações futuras.
A Amazônia é a sua casa. E a natureza, sua mãe. Por isso,
dificilmente saem em busca de outro chão, de outra Pátria. E, apesar da
fragilidade, das doenças e da debilidade; contribuem com a vida da comunidade
ou dos movimentos com uma missão bem definida: criar raízes bem profundas para
que a vida continue de pé.
Dentro desse quadro, Maria é presença viva e eficaz. É preciso
conquistar a mãe para chegar ao coração do Filho. Os idosos têm devoção
especial por Maria. É essa devoção a Nossa Senhora que os faz percorrer o caminho
da fé em Jesus Cristo. Exemplo disso são os inúmeros Círios que acontecem nas
pequenas Comunidades: Jeitinho paraense de fazer festa para Nossa Senhora.
A fé, a experiência de vida, o conselho e a oração são
ingredientes do seu entusiasmo e de sua eterna juventude; facilmente percebidos
na persistência em tirar do coração da terra o próprio sustento e prolongada na
luta em favor da preservação dos costumes e tradições.
Como Maria, os idosos agem no silêncio e na oração. Carregam o
peso da dor e da decepção, mas conseguem vislumbrar um novo céu e uma nova
terra.
Que Maria continue sendo a medianeira de todas as graças e que os
nossos idosos sejam sempre lembrados e suas angústias e aflições e abençoados
nas suas aspirações.
3ª REFLEXÃO:
Tema: Maria é
a chave que abre os corações das famílias para preservar as futuras gerações na
Amazônia. Texto
base: Lc 2, 39-40
A escuta e a simplicidade sempre foram as maiores
virtudes de Maria. Jesus aprendeu a conviver com as virtudes da mãe. Pouco se
sabe da vida de Jesus na sua casa em Nazaré. Mas, Maria o educava em
conformidade com a Lei do Senhor.
Em Nazaré e em toda a Judéia A Lei de Deus sempre
esteve acima de tudo. Era assunto nos bancos escolares, nas rodas de amigos,
nos templos, nos palácios e nas festas da comunidade. Cada família, cada pessoa
e cada comunidade... Todos se deixavam guiar por ela. O ambiente respirava a
Lei do Senhor!
Maria, juntamente com seu esposo José, não
descuidaram da educação de Jesus. E por causa desse cuidado de seus pais, Jesus
jamais se desviou da educação que recebeu. À medida que crescia e se tornava
robusto, enchia-se de sabedoria e a graça de Deus estava com ele.
A falta de educação na Lei do Senhor e a
desobediência a esses ensinamentos que está levando à destruição da vida na
Amazônia. Aqueles que se intitulam “filhos de Deus”, não hesitam em desobedecer
a suas ordens.
Na pressa em progredir e dominar, eles adotam as leis
dos deuses do “TER do SER e do PODER” e por causa desses deuses, (mas, usando o
nome de Deus verdadeiro), corrompem, pisam, perseguem, agridem roubam e matam
seus semelhantes. E todos esses “filhos de Deus”, saem de uma família.
O que será que está acontecendo com as famílias? Qual
o cuidado que os pais têm hoje com a educação de seus filhos? Qual a posição
que ocupa hoje a Lei do senhor dentro das casas e das famílias da Amazônia,...
De Tracuateua?
As famílias estão se desestruturando. Até no mais
intrincado da floresta Amazônica já se percebe o perigo que significam os meios
de comunicação social para as famílias.
A educação agora gira em torno da Lei dos Senhores da
Tecnologia, da Mídia e do tráfico. As lições de casa são: a corrupção, a
prostituição, a violência, a insegurança e o consumo de drogas, incentivados
pelos programas facilmente e fartamente disponíveis para todos em qualquer
casa, beco ou esquina.
Nesse turbilhão de inovações, as crianças e os jovens
perdem o interesse pela catequese. Os pais já não se importam com os costumes e
os deveres cristãos. A Igreja se acomoda e não resolve os problemas da
comunidade.
Uma Igreja com rosto Amazônico, é formada por pessoas
que buscam na Palavra de Deus um rumo para a vida em família e em
comunidade.
Maria é a chave que abre as portas e os corações para
que a Lei do Senhor possa penetrar nos lares das famílias amazônicas. A
Sabedoria de Jesus é esta NOVA LEI. E deve ser gravada nos corações de todos.
Que Maria fortifique as famílias no amor e na
humildade para que os filhos cresçam em sabedoria e graça diante de Deus.
4ª
REFLEXÃO:
Tema: Imitando
Maria, as famílias da Amazônia sempre encontrarão Jesus no seu caminho.
Texto
base: Lc 2, 41-52 – Jesus entre os doutores.
Maria tinha o costume freqüentar as festas
religiosas, com sua família. Jesus aprendeu cedo o caminho da Igreja. Desde sua
apresentação no Templo, Maria jamais se descuidou de cultivar esse aspecto da
vida de seu filho. E é assim que aos doze anos, sem avisar nada aos pais, Jesus
fica no Templo, para ouvir e interrogar os doutores acerca da Lei do Senhor.
Que aflição para a Mãe de Jesus! Quanta coisa deve
ter passado por sua cabeça: Teria sido seqüestrado? O que estaria fazendo?
Teria fome? Estaria longe?... Machucado?... Vivo? Muitas lembranças ela guardava em seu coração.
E, nesse momento deve também ter revivido momentos de alegria e de dor ao lado
de seu filho: o carinho trocado, as noites em claro, as orações em comum, o
brinquedo predileto... Ela que teve o privilégio de trazer no ventre o Filho de
Deus, agora o perdia e não sabia o que havia acontecido a ele.
Quantas mães, quantos pais ainda hoje, passam por
situação semelhante, no mundo inteiro e em particular, na nossa Amazônia, em
Tracuateua! Mães que tiveram os filhos seqüestrados. Mães que perderam filhos
que saíram de casa em busca de trabalho e não deram mais notícias. Mães que
perderam seus filhos trocados ou roubados nos hospitais. Mães que perderam seus
filhos para a prostituição, para as drogas e para o crime.
Como Mãe, a Igreja de Cristo também perdeu e continua
perdendo muitos filhos. Ao contrário de Maria e José, hoje muitos católicos
Deixaram de caminhar para a Igreja e para Deus. Alguns perderam o costume de
participar das festas religiosas. Outros desprezam os Sacramentos; desconhecem
a doutrina; ridicularizam as Leis do Senhor. Enveredaram por outros caminhos e
com eles, os filhos. Pais e filhos não se reconhecem mais. Cada um com seus
próprios interesses. Na maioria das famílias já não há lugar para o respeito,
para o diálogo, para o companheirismo, para a fé. Há muito mais perdas onde
estão presentes todos os membros de uma família do que com a morte de um deles.
Maria e José encontraram Jesus no Templo. Jesus
falava das escrituras e o povo todo extasiado diante de sua inteligência! Jesus fez parte de uma geração alicerçada no
exemplo dos seus antepassados. Suas atitudes e palavras não poderiam ser
diferentes. Por isso, diante da preocupação dos pais, responde com autoridade;
mas sua resposta foi como que uma declaração de amor a Maria e José: “Não
sabiam que devo estar na casa de meu Pai?”. Parece assim dizer: “Vocês me
ensinaram as escrituras, me educaram na fé de vocês, me disseram para fazer a
vontade do Pai e não sabem onde me encontrar?”. “Não precisa ir longe. Basta ir
à casa do meu Pai”.
Ah, todos os filhos de Deus, pudessem responder com a
mesma autoridade e amor a sua mãe e a sua Igreja!
Maria é o elo que nos une ao Cristo e Cristo ao Pai.
Ela nos revela os segredos mais íntimos do coração de Jesus. Por isso, é
necessário e urgente para o povo voltara a ser Igreja; encontrar-se de novo com
Deus. Aguçar a inteligência e crescer com sabedoria através das caminhadas e
celebrações. Saber onde encontrar Jesus e partilhar com Ele a Graça de Deus. Siga
Maria e encontrarás Jesus!
5ª REFLEXÃO:
Tema: Os povos
da Amazônia aprendem com Maria, que o sangue dos mártires é semente que brota
na velha luta pela vida.
Texto
base: Jo 19, 25-27 – Eis o teu Filho!
Perto da cruz de Jesus, Maria ouve a voz de Jesus:
“Mulher, eis o teu filho!”; Filho: “Eis a tua Mãe!”.
Maria entendeu logo que a sua missão não acabaria com
a morte de seu filho. Ela o perderia, mas muitos outros estariam em seu
caminho. Uma mulher, viúva sem filhos não conseguiria o respeito da sociedade.
Seria facilmente derrotada. Mas com muitos filhos para amá-la ela venceria
todas as dificuldades e estaria sempre pronta a proteger os filhos que a vida
lhe desse.
Isto é o que acontece até hoje. Somos milhões de
filhos espalhados por todo o mundo, por todo o Pará, por todo o município de
Tracuateua e temos em comum a nossa mãe Santíssima; a Mãe de Jesus. O Sangue de
Jesus não foi em vão. Todos nós continuamos lutando pela vida. Todos os dias,
Jesus continua derramando seu sangue por nós na Eucaristia. E Maria a nos
incentivar, a nos encaminhar para a luta
diária.
Não é diferente com a Amazônia. Este que já foi
considerado o pulmão verde do mundo, vem ganhando a cor da indiferença, do
pecado e da morte. A natureza chora as ações criminosas de seus próprios
filhos: florestas devastadas por grandes queimadas; poluição dos rios e mares;
tráfico dos animais; exploração ilegal das plantas, extermínio dos índios, e
massacre dos pobres, defensores da vida.
Mães assistem à morte de seus filhos em conflitos de
terra. A Igreja perde seus ministros em emboscadas, índios assistem as doenças,
matarem suas crianças. Mas o povo de Deus radicado na Amazônia é um povo que
não desiste fácil. Como Maria, ao pé da Cruz de Jesus, o povo Amazônico assume
a luta e o sonho dos mártires como sua luta, como seu sonho, porque todos nós
precisamos viver. Também os rios e igarapés, os animais e a floresta.
Cabe, a cada um de nós, filhos de Maria, herdeiros da
luta de Jesus, assumirmos o sonho e a missão de Jesus e começarmos a lutar para
que nós e a nossa floresta Amazônica com toda a sua diversidade sejamos
preservados e tratados com o respeito que merecemos.
Pensemos em Maria. Que sejamos um para o outro a Mãe
que recebe de Jesus a missão de proteger outros filhos, ou seja: a humanidade
inteira. Estes outros filhos somos todos nós, povos da Amazônia. Precisamos do amor de uma mãe como Maria que
nos protege e que nos defende em nossas necessidades. Pensemos também em João: o filho a quem Jesus
entregou a sua própria Mãe e pensemos na Amazônia como nossa casa. Que sejamos
outro João para Maria. E, vivendo na mesma casa; procuremos enchê-la de
carinho, ternura e amor; ajudando-a na luta diária para manter sempre em ordem,
a nossa grande casa (Amazônia), para que todos possam crescer com saúde,
amados, protegidos e respeitados.
É missão de toda a Igreja na Amazônia: assumir como
sua, a luta daqueles que buscam um novo destino para os povos da Amazônia e o
sonho daqueles que derramaram seu sangue em favor da vida destes mesmos povos e
desta mesma terra. Que Maria esteja sempre presente com sua mão protetora a
receber e a abençoar cada um daqueles que fazem da luta pela vida a sua
proposta de fé.
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